Força da Justiça

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sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Digna de ser amada


"Art. 1o  Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Art. 2o  Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.
Art. 3o  Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
§ 1o  O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 2o  Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
Art. 4o  Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar."

Assim começa a Lei Maria da Penha, esta adolescente de 14 anos apenas.

No jogo da violência doméstica, nós, mulheres, podemos demorar a entender que somos violentadas e aí tem várias questões e obviamente uma fonte desencadeadora, o machismo.

Desde crianças a maioria de nós possivelmente vivenciou situações de castração de nossa essência, de nossa liberdade, das mais invisíveis às mais chocantes. Liberdade tem a ver com o pensamento. Quanto menos livres, menos auto-conhecimento, mais alienação.

Lembro de intervir em uma cena na qual uma criança era chamada atenção, pois" não podia subir em árvores, afinal, era a única mulher do grupo e deveria dar o exemplo". Isto é violência de gênero, afinal aquela criança era uma mulher na idade infantil, parece pleonasmo, mas não é. Há dificuldade em perceber que meninas são violentadas por uma questões de gênero atreladas à infância, adolescência, raça e etc.

E por sermos violentadas de tantas formas e de tantos jeitos, a violência pode se tornar não identificada para a própria vítima que continua a ser sentir por vezes culpada pela situação (e encontra um coro forte que reforça essa ideia: "mulher gosta de apanhar", "mulher gosta de homem que não presta"...) e anestesiada diante das ações d@ agressor@.

A Lei Maria da Penha, como já dito, tem apenas 14 anos. De certa forma, já se mostra, retruca e é levantada pela voz dos grupos feministas organizados. O caminho foi aberto na própria história da lei (tentativa de homicídio de Maria da Penha pelo então marido, omissão do Estado Brasileiro e mandamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos para que legislasse a respeito da violência contra a mulher). Caminho aberto e várias batalhas temos ainda para desnaturalizar a violência contra mulheres, em quaisquer fases da vida, e termos mecanismos eficazes de combate, passando pela prevenção, pela responsabilização e tratamento dos agressores.

Recentemente ouvi de uma mulher como o ex-companheiro atendeu um chamado. Ela queria conversar sobre a filha mais velha deles, que tem por volta de 5 anos. Ele, com tantos episódios de agressão, fora visitar especialmente o filho mais novo, de 1 mês. Separados desde a fase final da gestação, detalhe: que ele não quis e tentou um aborto forçado, assim respondeu:

"O que foi? Você quer dar para mim? Eu não quero, você é fácil, mas se quiser me fazer uma chupetinha..."

Esta pessoa adoecida tenta mais uma vez repetir o jogo que aprendeu: rebaixar uma mulher a ponto de fazê-la sentir-se culpada, afinal como "um nada" pode querer respeito? Como este "nada" ousou enfrentá-lo e dar outro nome para o filho que não fosse Júnior? (lembrar do detalhe: filho que ele tentou abortar).

Espero que não tenha conseguido e reafirmo meu apoio no sentido da proteção integral, no que estiver ao meu alcance. Que este senhor possa ser chamado pela autoridade policial para esclarecimentos, tenha contra si o impedimento posto por medidas protetivas à mãe de seus filhos e que seja ouvido e responsabilizado pelo Poder Judiciário. Que seja acionado para o pagamento de pensão alimentícia. Que seja tratado! E mais: que possamos avançar e chamar para a discussão, nestes casos também,  outras leis de proteção à dignidade humana como o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei da Alienação parental, afinal falar desse jeito com a mãe na frente das filhas tem o poder de determinar perda de autoridade, uma das possibilidades que a lei aponta.

Para isso, Amanda*, precisamos de você.  Nós precisamos de você e você de nós.

Proponho que entre em um grupo de mulheres, como o MADA (www.grupomada.com.br ).  O bom de grupos como este é que é possível a superação da violência, através da escuta da experiência de outras mulheres, quebrando o sentimento de solidão, culpa e medo. Se você não quiser o grupo, inicie terapia individual com profissional que tenha a sensibilidade de perceber o círculo de violência que você tem vivido, ainda mais com a peculiaridade de você estar no pós-parto... Teu filho não tem nem 40 dias... Um contato é o do Instituto Gerar (http://www.institutogerar.com.br/,  https://www.facebook.com/institutogerar?fref=ts). O Grupo Mada é totalmente gratuito e no Instituto Gerar há a clínica social e você paga o que pode com a vantagem de indicarem profissionais que trabalham mais próximo à sua casa.

Proponho que você tome as medidas judiciais sim. Estarei com você e junto comigo há outras mulheres.

Você deu um passo importantíssimo. Lutou e defendeu teu filho contra a morte, contra herdar um nome imposto. Tudo isso mostrou a força latente que você possui.

Teu nome vem do latim, sabia? E significa "digna de ser amada". Eu também acho. Todas nós somos Amanda.


*nome fictício para preservar a identidade. Todas nós somos Amanda.









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