Em geral, mulheres mães me
procuram angustiadas quanto à possibilidade da filha ou do filho passar a
pernoitar com o pai como extensão do direito à convivência familiar. Narram aflitas a ausência paterna no cotidiano da criança e um certo
desrespeito ao modo como elas, mães sozinhas, guiam a educação dos filhos.
Quanto mais nova
a criança for, mais desesperador é o relato. Afinal, também faz parte do
respeito à criança preservar a condução de uma alimentação saudável, perceber e respeitar horários
de sono e etc, ainda que - sabidamente- rotinas possam ser um tanto adaptadas, fazer da mãe presente uma vilã e do pai, com "participação especial mensal", o "cara legal", coloca no alvo do sofrimento a própria criança. E quando ainda é
amamentada, a angústia e o desespero não parecem substantivos aptos a resumir o
quadro, talvez a palavra mais apropriada seja mesmo: dor.
Abro o primeiro parênteses para
dizer que me pauto na história de mulheres mães corajosas, verdadeiras, capazes
de se auto-analisarem para proteger seus filhos e conduzir o próprio processo de amadurecimentos. São estas mulheres que
felizmente me procuram e as histórias que ouço me permitem a liberdade de
escrever esse texto.
Peço licença para dizer que escreverei
como quem e para quem se reconhece no direito de sentir. Sim, sentir,
sentimentos. Ou seja, aqui os termos jurídicos entrarão depois – e se for o
caso.
Dizer da angústia em saber que
seu filho ou filha poderá ficar por horas longe do resguardo materno é quase
que sempre mal interpretado pela ideologia machista que transita em boa parte
das escutas, passando pela vizinha, Judiciário e até mesmo pela família. Por
vezes, a primeira interpretação é a de que se trata de retaliação, afinal a
mulher “só” pode estar se sentindo rejeitada por aquele homem que é pai da criança e
por isso “inventa” questões. Junto a isso vem a questão de “tornar a criança
dependente de si”, não cooperar para a autonomia do filho para tornar a criança dela dependente e a
distanciar do pai e blablablá.
Infelizmente é assim que a mulher é ouvida muitas
vezes: como a costela de Adão. Em outras palavras, a mulher é vista como aquela
“que já não é mais esposa, companheira, namorada de fulano de tal e com ele tem
um filho”.
A legislação determina que o
superior interesse da criança é o que deve prevalecer e se o contexto é de pais
que garantem a integridade física e emocional, há de se pensar que a criança
deve estar ao lado da família materna e paterna. Ocorre que quando não há
consenso sobre a possibilidade da criança pernoitar na casa do pai, tem-se
quase um automatismo nas decisões judiciais que, em boa parte, pautam-se pela
idade e pelos esteriótipos já mencionados.
Embora estudos mais sérios
apontem a idade de dois anos como ponto de partida para o fim da fase de maior
dependência da mãe, há uma tendência de entender a afirmação de forma
incompleta, afinal o dito indica ponto de partida e não o fim.
Ademais, ainda que a criança
conte com mais idade, cabe aos pais o esforço de manterem o respeito ao ritmo da
criança, a forma que tem sido orientada. Algo importante que garante maior
tranquilidade à mãe e segurança à criança.
Ocorre, porém, que quanto maior o
conflito entre os pais, maior também é a chance dessa rotina básica não ser
preservada quer seja por capricho ou por falta de diálogo mesmo.
Conflitos acontecem e, por muitas vezes, são inevitáveis e não devem ser depositados exclusivamente na conta da mulher e, tampouco, descontados na criança. Em casos, por exemplo, em que o pai ausente ingressa com a ação de regularização de visitas e consegue levar a criança que mal o conhece e vice-versa até para outra cidade, aconteceu tudo, menos um estudo aprofundado que levasse em consideração a própria criança, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Convenção dos Direitos da Criança.
Penso que devemos ter coragem para questionar o automatismo do Poder Judiciário nestas decisões bem como o machismo, classismo e racismo institucionais. Ser mãe neste país nos põe em situação de vulnerabilidade por todos os lados, quando o ideal era termos o reconhecimento de que geramos a vida e a maternidade nos fortalece. Então, busquemos estar juntas e nos reconhecermos como mulheres que somos (que dádiva!)
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